O mercado físico de soja chega ao fim de 2025 em um compasso de espera que se espalha por praticamente todas as regiões produtoras do Brasil. Negócios acontecem de forma pontual, com volumes reduzidos, e a palavra que melhor define o momento é cautela. De um lado, compradores atuam de maneira defensiva, testando preços e evitando alongar posições. Do outro, produtores resistem em fechar vendas, especialmente da safra nova, diante de cotações que mal cobrem os custos de produção em muitas propriedades.
Segundo analistas do setor, a combinação de Chicago pressionada, câmbio estável, estoques elevados no Brasil e incertezas sobre os custos da próxima safra criou um ambiente em que ninguém quer dar o primeiro passo. Em diversas praças, as cotações até registraram leve alta nas últimas semanas, mas esse movimento está mais relacionado à falta de oferta e de referência clara de mercado do que a uma melhora efetiva nos fundamentos.
Sul do Brasil: preços firmes, mas negócios escassosNa Região Sul, o cenário é de preços relativamente firmes, porém com volume de negócios considerado muito baixo. No Rio Grande do Sul, as referências giram em torno de R$ 142,00 por saca nos portos, enquanto no interior os valores variam entre R$ 122,00 e R$ 136,00, dependendo da praça e da qualidade do grão. Apesar desses patamares, o mercado segue travado: compradores sinalizam interesse, mas encontram produtores que fazem contas detalhadas e preferem segurar a soja armazenada.
Em muitas regiões gaúchas, a soja remanescente da safra velha está bem estocada, o que dá ao agricultor mais poder de decisão. Parte significativa dos produtores só aceita negociar se enxergar uma reação mais consistente em Chicago ou uma mudança relevante no câmbio, fatores que até o momento não se confirmaram.
Em Santa Catarina, o estado se consolida cada vez mais como importador líquido de soja. A infraestrutura portuária catarinense é utilizada tanto para o escoamento quanto para a entrada de grãos destinados ao consumo interno, principalmente para a indústria de ração e proteína animal. As cotações próximas de R$ 142,50 por saca no porto refletem essa disputa constante entre a demanda interna e a exportação, mantendo preços firmes, mas sem gerar um aumento expressivo no volume de negócios.
No Paraná, o mercado é considerado o mais equilibrado da região. Paranaguá opera próximo de R$ 143,00 por saca, enquanto no interior os preços variam de pouco abaixo de R$ 130,00 até níveis acima de R$ 140,00, conforme a localidade. Ainda assim, a leitura predominante é a mesma observada nos estados vizinhos: há preço, mas falta apetite para fechar negócio.
Centro-Oeste: indústria seletiva e produtor no limiteNo Centro-Oeste, a fotografia do mercado ajuda a explicar por que muitos analistas classificam o momento como de “paralisia virtual”. Em Mato Grosso do Sul, a política agressiva de atração de esmagadoras e usinas de biodiesel garante alguma sustentação à demanda local. Em praças como Dourados, Campo Grande, Maracaju, Chapadão do Sul e Sidrolândia, os preços variam entre R$ 122,00 e R$ 126,00 por saca.
Mesmo com essa sustentação, a indústria se mostra mais seletiva. As compras são feitas apenas para atender às necessidades imediatas, evitando formar estoques maiores diante da fraqueza das cotações internacionais. O resultado é um mercado funcional, porém lento.
Já em Mato Grosso, maior produtor de soja do país, a situação é considerada a mais delicada. Em regiões estratégicas como Sorriso, Lucas do Rio Verde, Nova Mutum, Campo Verde, Primavera do Leste e Rondonópolis, os preços entre R$ 117,00 e R$ 122,00 por saca ficam perigosamente próximos ou até abaixo do custo total de produção em muitas propriedades.
Nesse contexto, o produtor adota uma postura defensiva. A safra nova não é fixada, as decisões são alongadas ao máximo e as vendas acontecem apenas em volumes pontuais, geralmente para fazer caixa e honrar compromissos de curto prazo, como custeio, financiamentos e despesas operacionais.
Por que o mercado de soja travou em 2025?Especialistas apontam três fatores principais para explicar o marasmo do mercado de soja neste fim de 2025. O primeiro deles é a pressão exercida pela Bolsa de Chicago, que reflete a boa oferta nos Estados Unidos e a perspectiva de estoques globais relativamente confortáveis para a safra 2025/26, mesmo com uma leve revisão para baixo na estimativa mundial.
O segundo fator é o câmbio estável. A ausência de uma valorização mais forte do dólar frente ao real retira competitividade extra do produto brasileiro e não consegue compensar a fraqueza das cotações internacionais. Com isso, o prêmio de exportação não é suficiente para impulsionar preços mais atrativos na porteira.
O terceiro elemento é o estoque interno elevado. Após uma safra cheia, exportações fortes no primeiro semestre e uma retenção maior no segundo semestre, o Brasil chega ao fim do ano com volumes expressivos de soja armazenados. Esse cenário amplia o poder de escolha dos vendedores, mas também aumenta o risco de gargalos logísticos quando a nova safra começar a entrar no sistema.
Analistas avaliam que o mercado só deve ganhar mais fluidez quando alguns pontos ficarem mais claros: o avanço efetivo da colheita da safra sul-americana, uma possível retomada mais consistente das compras chinesas e alguma mudança relevante no câmbio ou em Chicago. Até lá, a tendência é de continuidade do ritmo lento.
O cenário internacional e o impacto nos preçosNo mercado global, o ambiente também não favorece uma reação rápida dos preços. Os Estados Unidos concluíram uma colheita robusta, e o Departamento de Agricultura norte-americano (USDA) estima os estoques mundiais de soja em torno de 124 milhões de toneladas para a safra 2025/26, ligeiramente acima do ciclo anterior.
Ao mesmo tempo, a China, principal compradora mundial, opera com estoques confortáveis e apresentou, em alguns meses, volumes de compra abaixo da média histórica. Esse comportamento reduz a pressão imediata da demanda sobre os exportadores e contribui para a manutenção de um mercado internacional mais acomodado.
Mesmo assim, a soja brasileira segue competitiva no cenário externo e caminha para um novo recorde de exportações no acumulado do ano. Contudo, esse desempenho não se traduz automaticamente em preços melhores para o produtor no mercado interno neste fim de 2025.
Estratégia no campo: cautela e disciplinaDiante desse quadro, a sensação predominante entre os produtores é de que o jogo ainda não está perdido, mas exige disciplina. Controlar custos, usar bem a estrutura de armazenagem disponível, avaliar operações de barter e travas de preço quando surgirem janelas mais favoráveis e evitar decisões apressadas são estratégias cada vez mais presentes no planejamento das propriedades.
Especialistas também destacam que o giro tende a aumentar quando o escoamento da safra 2025/26 se aproximar do pico, especialmente no Centro-Oeste. A pressão sobre armazéns e a necessidade de liberar espaço podem forçar vendas e trazer mais liquidez ao mercado. Até lá, porém, a estratégia dominante segue sendo clara: vender o mínimo necessário, acompanhar de perto o cenário global e atravessar esse período de mercado “de lado” com o máximo de cautela possível.