O setor sucroenergético do Brasil vive um momento de forte pressão. A queda acentuada nos preços internacionais do açúcar reacendeu preocupações entre produtores do centro-sul, que já avaliam mudanças significativas no planejamento agrícola para os próximos anos. Com margens reduzidas, custos elevados e um cenário de incerteza, cresce a possibilidade de redução da área plantada com cana-de-açúcar a partir da safra 2026/27.

Na semana passada, os futuros do açúcar bruto atingiram 14,04 centavos de dólar por libra-peso, a menor cotação dos últimos cinco anos. Embora na sexta-feira (14) o preço tenha encerrado o dia em 14,96 centavos, ainda permanece distante dos níveis registrados em ciclos recentes, quando o mercado operou em patamares mais elevados e garantiu maior rentabilidade aos produtores.

Pressão sobre custos e ambiente de incerteza

Com a queda nos preços, os produtores enfrentam um ambiente de risco que pode comprometer investimentos essenciais nos canaviais. Em vários municípios do interior paulista, especialmente na região de Assis e cidades vizinhas, agricultores já avaliam o impacto da baixa rentabilidade sobre os custos de manejo.

A renovação dos canaviais — processo fundamental para garantir produtividade — pode ser reduzida. Em alguns casos, produtores começam a considerar ajustes na área total plantada, especialmente para o ciclo 2026/27. O risco é que essa retração acabe refletindo na produção projetada para 2027/28, que tende a ser impactada se a atual situação de mercado persistir.

Há cerca de três anos, muitos agricultores que cultivavam grãos migraram parcial ou totalmente para a cana, atraídos pelos preços elevados do açúcar e pela maior estabilidade da cultura. Agora, esse movimento pode ser revertido. Porém, mesmo culturas como a soja enfrentam preços menos favoráveis na região, tornando a tomada de decisão ainda mais complexa.

Mix de produção recua no Centro-Sul

O ambiente desafiador também afeta a distribuição da matéria-prima entre açúcar e etanol. Dados divulgados pela UNICA (União da Indústria de Cana-de-Açúcar) mostram que o mix de açúcar nas usinas do Centro-Sul caiu de 55% em agosto para 46% na última semana.

Essa redução representa uma leve migração da moagem para o etanol. Contudo, essa mudança não tem se traduzido em melhora significativa nas margens do setor, em função da crescente participação do etanol de milho no mercado brasileiro.

Avanço do etanol de milho altera dinâmica do setor

Nos últimos anos, o Brasil registrou forte expansão na produção de etanol de milho, especialmente no Centro-Oeste. A entrada desse novo protagonista no mercado ampliou a oferta do biocombustível e reduziu a dependência do etanol produzido a partir da cana.

Como consequência, os preços do etanol não apresentaram a reação esperada pelos produtores de cana, mesmo em períodos de maior demanda ou oscilação no preço da gasolina. A nova estrutura de mercado dificulta que o etanol se torne uma alternativa de escape para as usinas em momentos de desvalorização do açúcar.

Esse movimento representa uma mudança estrutural: a cana, antes dominante no setor sucroenergético, agora divide espaço com uma fonte que cresce em ritmo acelerado e influencia diretamente o equilíbrio entre oferta e demanda de etanol no país.

Planejamento das próximas safras exige cautela

Diante da volatilidade no mercado internacional do açúcar e da pressão exercida pelo etanol de milho, os produtores de cana do centro-sul caminham com cautela em relação aos próximos ciclos agrícolas. A tendência observada é de redução ou postergação de investimentos, principalmente em áreas de intensificação produtiva, como:

  • Renovação de canaviais

  • Correção de solo

  • Aplicação de fertilizantes

  • Aquisição de maquinário

  • Expansão de área plantada

Essas decisões afetam não apenas a safra de curto prazo, mas também o desempenho das lavouras ao longo de todo o ciclo produtivo da cana, que tem uma vida útil de cinco a seis anos.

Caso o cenário atual persista, a produção nacional pode sofrer impactos a partir de 2027, tanto em volume quanto em qualidade da matéria-prima disponibilizada às usinas.

Com o açúcar atingindo o menor patamar em cinco anos e o etanol de milho ganhando espaço no mercado, o setor sucroenergético brasileiro enfrenta um dos momentos mais desafiadores da última década. A possível redução da área plantada e a diminuição de investimentos podem redesenhar o mapa da canavicultura no país nos próximos anos.