Brasil inaugura primeira usina de etanol de trigo e impulsiona inovação na matriz energética

O Brasil está prestes a viver um marco na diversificação da produção de biocombustíveis. Em agosto, será inaugurada, em Santiago, no Rio Grande do Sul, a primeira usina de etanol de trigo do país. O projeto, desenvolvido pela CB Bioenergia, representa um investimento de aproximadamente R$ 100 milhões e promete gerar impactos econômicos, ambientais e energéticos significativos.

O etanol é tradicionalmente produzido no Brasil a partir da cana-de-açúcar, cultura que encontra melhores condições de cultivo em regiões de clima tropical e subtropical. No entanto, essa dependência limita o potencial de produção em áreas onde o cultivo da cana é inviável, como em grande parte da Região Sul. Nesse cenário, o trigo surge como uma alternativa viável e inovadora, aproveitando resíduos e subprodutos que muitas vezes são descartados ou subutilizados.

Na Europa, o etanol de trigo já é amplamente utilizado como biocombustível e integra estratégias de redução de emissão de gases de efeito estufa. No Brasil, essa tecnologia ainda é recente, mas carrega potencial para aumentar a produção nacional de biocombustíveis, reduzir a necessidade de importação e promover uma economia circular, onde resíduos agrícolas ganham novos usos.

Processo de implantação e pesquisas

A escolha do trigo como matéria-prima para a usina de Santiago foi resultado de um trabalho de pesquisa de três anos e meio, no qual mais de 150 variedades cultivadas no Rio Grande do Sul passaram por testes laboratoriais detalhados. Essa etapa foi fundamental para garantir que a produção fosse eficiente, sustentável e adaptada às características locais.

A tecnologia envolvida no processo utiliza soluções biotecnológicas capazes de otimizar a produção. Enzimas específicas reduzem a viscosidade natural do trigo, facilitando o processamento, enquanto leveduras adaptadas garantem flexibilidade na utilização de diferentes tipos do cereal. Essa combinação aumenta o rendimento industrial, possibilitando a produção de volumes adicionais de etanol sem aumento proporcional no consumo de matéria-prima.

A capacidade inicial da usina está projetada para produzir entre 10 e 12 milhões de litros de etanol hidratado por ano. Com a adoção das tecnologias e estratégias de otimização, o potencial de produção anual pode chegar a 34 milhões de litros. Além disso, há um plano de expansão ambicioso para atingir até 50 milhões de litros de etanol anidro anuais até 2027, com novos investimentos estimados em R$ 500 milhões.

Aproveitamento integral dos subprodutos

Outro diferencial importante da usina é a adoção de um sistema de operação em circuito fechado, garantindo o máximo aproveitamento de todos os subprodutos gerados. O álcool neutro, obtido durante o processo, será direcionado para a indústria de perfumaria e bebidas. O resíduo sólido poderá ser transformado em produtos biodegradáveis, enquanto o líquido resultante será utilizado como adubo em propriedades rurais da região.

O dióxido de carbono (CO₂) gerado também passará por purificação para atender padrões alimentícios, permitindo seu uso na indústria de bebidas. Essa abordagem reforça o conceito de economia circular e evita desperdícios, transformando cada etapa da produção em oportunidades de geração de valor.

Impacto econômico e redução de custos no estado

Além do impacto ambiental positivo, a usina deve contribuir para tornar o etanol mais acessível no Rio Grande do Sul. Atualmente, o combustível renovável tem preço superior ao da gasolina no estado, em grande parte devido à necessidade de importação de outros estados produtores.

Para ampliar a distribuição e garantir preços mais competitivos, a CB Bioenergia prevê investir R$ 20 milhões adicionais na construção de um posto de combustível em Santiago, abastecido diretamente pelo etanol de trigo produzido localmente.

Perspectivas futuras

A inauguração da primeira usina de etanol de trigo do Brasil marca um avanço importante na diversificação da matriz energética nacional. Além de reduzir a dependência da cana-de-açúcar, o projeto abre espaço para que outros cereais, como milho, cevada e sorgo, também sejam utilizados na produção de biocombustíveis.

Com o fortalecimento dessa indústria, o país poderá ampliar sua participação no mercado global de energias renováveis, gerar empregos, reduzir emissões de gases poluentes e estimular a economia em regiões agrícolas.

O modelo adotado em Santiago poderá servir de referência para novos empreendimentos no Sul e em outras áreas com potencial para o cultivo de cereais, consolidando o Brasil como líder na produção de biocombustíveis de diferentes origens e impulsionando a transição para uma matriz energética mais limpa e sustentável.