O Brasil, maior exportador de café do mundo, enfrenta uma crise logística que ameaça a competitividade do setor e já causa prejuízos bilionários. Apenas em junho de 2025, o país deixou de embarcar 453.864 sacas de 60 kg, o equivalente a 1.375 contêineres, devido à saturação dos principais portos. O impacto foi direto: R$ 3 milhões em custos extras de armazenagem e detenção de contêineres, além da perda de R$ 1,022 bilhão em receita cambial no mês, segundo dados do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé).

Desde o início do monitoramento, em junho de 2024, os custos logísticos adicionais já superam R$ 78,9 milhões, sem contar o prejuízo sentido pelos cafeicultores. Em média, mais de 90% da receita das exportações é repassada diretamente aos produtores, o que agrava o cenário para o campo.

Safra recorde pressiona logística nacional

O aumento dos embarques coincidiu com a chegada da nova safra, especialmente do café canéfora (robusta e conilon), responsável por pressionar ainda mais os terminais. O volume não embarcado em junho foi 100 mil sacas maior que em maio, e a expectativa é de que a situação se complique no segundo semestre, quando o café arábica, principal variedade exportada pelo Brasil, também começa a escoar.

Para os exportadores, a equação é clara: sem medidas urgentes, a defasagem logística pode comprometer contratos internacionais e a imagem do país como fornecedor confiável.

Portos de Santos e Rio de Janeiro em colapso

Os dados revelam que o problema é generalizado e não se restringe a um único porto.

  • Porto de Santos: responsável por 80% dos embarques no primeiro semestre de 2025, registrou 59% de atrasos ou mudanças de escala em junho. O tempo máximo de espera foi de 37 dias.

  • Porto do Rio de Janeiro: segundo maior escoador, com 15,7% dos embarques, teve 57% de atrasos, com espera de até 20 dias.

Esse cenário evidencia que a logística portuária brasileira está em saturação crítica, afetando diretamente a capacidade do país de manter sua liderança mundial nas exportações de café.

Falhas estruturais e propostas de solução

Segundo especialistas e representantes do setor, como Nicolau Heron, presidente do Cecafé, é preciso uma resposta imediata. Entre as medidas defendidas estão:

  • Aceleração dos leilões de terminais portuários para ampliar a capacidade operacional;

  • Investimentos em ferrovias e hidrovias, reduzindo a dependência do transporte rodoviário e descongestionando os portos;

  • Ampliação de pátios e berços para acomodar mais navios simultaneamente;

  • Criação de indicadores logísticos que permitam monitorar gargalos e planejar a expansão da infraestrutura de acordo com a demanda.

Apesar de o governo federal ter anunciado novos investimentos, a conclusão das obras pode levar até cinco anos, prazo considerado longo demais diante da urgência.

Polêmica no leilão do Tecon Santos 10

Outro ponto de preocupação é a restrição de participação no leilão do Tecon Santos 10. A Nota Técnica nº 51 da ANTAQ alertou que a limitação pode gerar concentração de mercado, afastando potenciais concorrentes e até resultando em judicialização do processo. Para o setor, isso representa mais um risco de atraso na solução dos problemas estruturais.

Risco de perda de mercado internacional

No primeiro semestre, a situação foi parcialmente contornada devido à entressafra de outras commodities, o que reduziu a pressão sobre os terminais. Mas a tendência para o segundo semestre é de piora: além da safra de arábica, outros produtos agrícolas e industriais voltarão a disputar espaço nos portos.

Caso não haja intervenção imediata, o Brasil pode perder espaço no mercado internacional de café, abrindo brechas para concorrentes como Vietnã e Colômbia. Isso afetaria diretamente a renda dos cafeicultores, que já sofrem com custos de produção elevados e margens apertadas.

O gargalo logístico vivido pelo Brasil em 2025 é um alerta vermelho para a cadeia do café. Se por um lado o país mantém a liderança global em produção e qualidade, por outro enfrenta um descompasso estrutural que ameaça escoar boa parte dos ganhos conquistados nas lavouras. Sem soluções rápidas e eficazes, a maior riqueza agrícola brasileira corre risco de se transformar em um prejuízo ainda maior nos próximos meses.