A colheita da soja no Rio Grande do Sul está praticamente finalizada, marcando o encerramento de uma das safras mais desafiadoras das últimas décadas. Segundo o Informativo Conjuntural divulgado pela Emater/RS-Ascar nesta quinta-feira (29/05), restam apenas áreas pontuais de segundo cultivo ou de implantação tardia, que conseguiram escapar do período mais crítico da estiagem. Essas áreas remanescentes representam menos de 0,5% do total cultivado e não devem afetar a produtividade média estadual, que ficou muito abaixo do esperado.

A área plantada com soja no Rio Grande do Sul nesta safra foi estimada em 6.770.405 hectares. No entanto, a produtividade da soja caiu para 1.957 kg por hectare, uma retração significativa de 38,43% em comparação à projeção inicial de 3.179 kg/ha, feita antes do plantio. Essa redução é atribuída, principalmente, aos efeitos da estiagem prolongada que atingiu o Estado nos últimos meses, especialmente durante as fases críticas do desenvolvimento das lavouras.

Estiagem deixa rastro de prejuízos e produtores enfrentam crise financeira

As consequências da estiagem vão além das perdas agronômicas. Com custos de produção em alta e receita fortemente comprometida, milhares de produtores gaúchos enfrentam sérias dificuldades para quitar dívidas adquiridas no início do ciclo. A situação levou ao aumento da demanda por securitização de dívidas rurais, mecanismo que permite o refinanciamento e o alongamento dos prazos de pagamento com melhores condições.

Setores do agronegócio e lideranças políticas do Rio Grande do Sul já pressionam o governo federal por medidas emergenciais, como linhas especiais de crédito, suspensão de parcelas de financiamentos rurais e programas de renegociação com subsídios. Segundo entidades representativas, a adoção de tais políticas é crucial para evitar um colapso financeiro nas regiões mais atingidas.

Além disso, há grande preocupação com a safra 2025/2026. Sem apoio efetivo, muitos produtores avaliam reduzir a área plantada com soja ou mesmo mudar o sistema produtivo, optando por culturas menos arriscadas diante da instabilidade climática.

Milho também sofre com o clima: colheita ainda não foi concluída

A colheita do milho no Rio Grande do Sul também segue impactada pelas condições meteorológicas adversas. Até o momento, cerca de 96% das áreas plantadas já foram colhidas, mas 3% das lavouras estão em fase de maturação e 1% ainda em enchimento de grãos, correspondendo principalmente à segunda safra.

As chuvas no sul do Brasil, embora importantes para recompor a umidade do solo, têm dificultado a entrada das máquinas no campo, atrasando a finalização da colheita. As lavouras remanescentes, no entanto, apresentam bom potencial produtivo, o que aumenta a expectativa de bons resultados nessas áreas específicas, desde que o clima colabore nas próximas semanas.

Muitos agricultores já iniciaram o preparo do solo para a próxima safra de milho. Em diversas regiões, estão sendo semeadas culturas de cobertura, como o nabo forrageiro, que será posteriormente dessecado para dar lugar ao milho a partir de agosto. A estratégia visa proteger o solo e melhorar a fertilidade, além de mitigar os impactos das variações climáticas.

Sinais de alerta para o futuro da produção agrícola gaúcha

O desempenho negativo da safra de soja no RS levanta um sinal de alerta importante. A agricultura gaúcha, fortemente dependente de culturas de grãos como soja e milho, enfrenta um cenário cada vez mais marcado por eventos climáticos extremos, como estiagens prolongadas seguidas de chuvas intensas.

Sem planejamento adequado, gestão de risco climático e suporte governamental, o Estado pode ver sua capacidade produtiva comprometida nos próximos anos. Especialistas defendem a ampliação do seguro agrícola, o fortalecimento da assistência técnica e maior incentivo à diversificação de culturas e adoção de tecnologias mais resilientes, como plantio direto e agricultura de precisão.

A urgência de uma resposta estruturada

A conclusão da colheita da soja no Rio Grande do Sul, mesmo que parcial, representa mais do que o fim de um ciclo produtivo: é o reflexo de um sistema que precisa se adaptar urgentemente às novas condições do clima. Os produtores fizeram sua parte, mas agora dependem de políticas públicas que garantam condições mínimas para seguirem produzindo e alimentando o país.

Se o Brasil quer manter sua liderança no agronegócio global, será necessário olhar com mais atenção para realidades como a do Rio Grande do Sul — onde o clima já começou a mudar, e o campo, mais uma vez, paga a conta.